sábado, 15 de dezembro de 2012

Quero Liberdade (cap. IV), de Rose Wilder Lane


IV

Na Rússia, então, nossa esperança tinha se realizado; a revolução econômica tinha acontecido. O Partido Comunista capturara o poder com o grito: “Todo poder aos conselhos!”

O capitalismo de estado da Rússia e as tímidas tentativas de livre empresa foram destruídos e o povo controlava a riqueza nacional. Ou melhor: na realidade, um homem sincero e extremamente capaz – Lênin – estava no poder, devotado à estupenda tarefa de reduzir multidões de seres humanos à ordem econômica eficiente, o que esse homem e seus seguidores honestamente acreditavam que fosse o máximo bem-estar material daquelas multidões.

E o que eu via não era uma extensão da liberdade humana, mas o estabelecimento da tirania numa base nova, amplamente estendida e mais profunda.

A novidade histórica do governo soviético era sua razão de ser. Outros governos existiam para manter a paz entre seus súditos ou para arrecadar dinheiro deles ou para usá-los no comércio e na guerra para a glória dos homens que os governavam. Mas o governo soviético existia para fazer o bem a seu povo, quer ele gostasse disso ou não.

E eu sentia que, de todas as tiranias às quais os homens foram submetidos, aquela tirania seria a mais implacável e a mais dolorosa de suportar. Existe algum refúgio para a liberdade sob outras tiranias, uma vez que são menos completas e não são tão armadas de virtude sem remorsos. Mas eu não conseguia identificar nenhum tipo de refúgio contra a benevolência no poder econômico.

Todos os relatos sobre a União Soviética que ouvi desde então confirmaram essa opinião. E ouço apenas relatos dos seus amigos, já que acredito que os comunistas são quem melhor entende o que ocorre lá.

Há vinte e sete anos, os homens que dirigem o país labutam prodigiosamente para criar precisamente a sociedade com a qual sonhamos: uma sociedade em que a insegurança, a pobreza e a desigualdade econômica são impossíveis.

Por esse fim, suprimiram a liberdade pessoal; liberdade de movimento, de escolha do trabalho, liberdade de manifestação pessoal no modo de vida, liberdade de expressão, liberdade de consciência.

Dado seu objetivo, não vejo como poderiam ter feito diferente. A extração de comida da terra e do mar, a produção de bens a partir de matérias-primas reunidas, e seu armazenamento, troca, transporte, distribuição e consumo por vastas multidões de seres humanos são atividades tão intricadamente inter-relacionadas e interdependentes que o controle eficiente de qualquer parte delas exige o controle do todo. Nenhum homem pode controlar multidões de homens assim sem coerção e essa coerção precisa aumentar com o tempo.

Precisa aumentar, porque os seres humanos são naturalmente diversos. É da natureza humana fazer a mesma coisa de maneiras diferentes, perder tempo e energia mudando a forma das coisas, experimentar, inventar, cometer erros, abandonar o passado numa variedade infinita de direções. Plantas e animais repetem a rotina, mas homens que não são reprimidos irão ao futuro como exploradores de um novo país e a exploração é sempre perdulária. Grandes quantidades de exploradores não conseguem nada e muitos se perdem. A coerção econômica é, portanto, constantemente ameaçada pela obstinação humana. Ela precisa constantemente superar essa obstinação, esmagar todos os impulsos de egotismo e independência, destruir a variedade de desejos e comportamentos humanos. O poder econômico centralizado, esforçando-se por planejar e controlar os processos econômicos de uma nação moderna, existe sob a necessidade ou de fracassar ou de se tornar o poder absoluto sobre cada área da vida humana.

Não importa o que acontece aos indivíduos – diz o comunista. – O indivíduo não é nada. A única coisa que importa é o Estado coletivista.

A esperança comunista de igualdade econômica na União Soviética repousa hoje na morte de todos os homens e mulheres que são indivíduos. Uma nova geração, eles me dizem, já está sendo forjada e educada assim, de maneira que está sendo criada de fato uma massa humana; milhões de homens e mulheres jovens que possuem, de verdade, a psicologia de uma colmeia de abelhas, de um formigueiro.

Isso não me parece tão inacreditável quanto já pareceu. Pode já existir uma colmeia humana na Rússia. Não seria a única na história; existiu Esparta.

Existiu Esparta, imutável em suas rígidas formas de comportamento e pensamento padronizados, até que foi destruída por um inimigo externo. Existe a colmeia de abelhas, estática, imutável através de incontáveis gerações de indivíduos que repetem incessantemente o mesmo padrão de ações devotadas ao bem de todos. Se não há progresso na vida, isso não é vida; é um tipo de morte animada e respirando.http://www.libertarianismo.org/index.php/biblioteca/234-rose-wilder-lane/1074-quero-liberdade

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