domingo, 28 de dezembro de 2014

Um País Partido, de Marco Antonio Villa

Marco Antonio Villa tem uma impressionante capacidade de escrever muitos livros bons em pouco tempo. Depois de Mensalão, Década Perdida e Ditadura à Brasileira, o mais recente é Um País Partido - 2014: A Eleição Mais Suja da História.

Villa começa relatando brevemente todas as vinte e nove eleições da República antes de 2014. Dessas, oito foram indiretas: a primeira, de Deodoro da Fonseca, em 1891, a de Getúlio Vargas, em 1934, e as seis da ditadura militar. Certamente, nenhuma das vinte e nove foi tão disputada como a de 2014.

A narrativa da eleição atual começa em fevereiro, com o início do ano legislativo e do ano judiciário. Dilma trocou alguns ministros por causa das eleições. Em março, foi divulgado o escândalo da compra da refinaria de Pasadena pela Petrobras. Em 30 de abril, a presidente ocupou uma rede nacional de rádio e televisão, por ocasião da véspera do Dia do Trabalho, para fazer propaganda de seu governo. Anunciou um aumento de 10% nos valores do Bolsa Família e a correção da tabela do imposto de renda. A Justiça Eleitoral não se incomodou com isso.  

Em julho, o Banco Santander divulgou a uma parcela de seus clientes uma avaliação pessimista da conjuntura econômica do Brasil relacionada à perspectiva de vitória de Dilma. Lula e o PT exigiram a demissão dos autores dessa avaliação. O Santander cedeu. Em seguida, o PT reclamou ao Tribunal Superior Eleitoral contra textos de propaganda da consultoria Empiricus, com o mesmo tipo de opiniões. Conseguiu proibir a divulgação dos anúncios.

Os escândalos não paravam. A revista Época mostrou que uma nora de Lula e a esposa do deputado cassado e condenado pelo mensalão João Paulo Cunha eram funcionárias fantasmas do SESI. A Veja divulgou que as perguntas feitas aos diretores da Petrobras na CPI, incluindo a presidente Graça Foster, foram combinadas previamente. Num movimento inédito de uso da máquina pública a serviço de interesses particulares, o Advogado Geral da União, Luís Inácio Adams, foi ao Tribunal de Contas da União fazer uma defesa da presidente da Petrobras.

Villa narra detalhadamente as entrevistas de Aécio Neves e Eduardo Campos ao Jornal Nacional, com grande pressão dos entrevistadores sobre os candidatos.

Voltando da entrevista, aconteceu a grande tragédia da eleição, o acidente fatal com o avião de Eduardo Campos. Marina Silva é escolhida a nova candidata do PSB. Em vez de Dilma ir ao Jornal Nacional, o Jornal Nacional vai até ela, entrevistando-a no Palácio do Alvorada, em condições vantajosas em relação a seus adversários. 

Com o início do horário eleitoral gratuito, Marina disparou nas pesquisas. Aproveitando-se do bom momento, a candidata do PSB fez várias exigências e entrou em polêmicas com membros históricos do partido. Vários deles abandonaram sua campanha. Descobriu-se que a situação do avião que transportava Eduardo Campos era completamente irregular. Marina foi bastante questionada por isso, especialmente em sua entrevista ao Jornal Nacional, e sempre se esquivou do assunto.

Como Villa conta cada lance da eleição em ordem cronológica, intercalando com os resultados de cada pesquisa eleitoral, estamos sempre acompanhando a evolução do processo. Vêm os rumores da delação premiada de Paulo Roberto Costa, depois as notícias, depois a delação de Alberto Youssef. Villa fala sobre cada debate do primeiro turno, com a participação preponderante dos candidatos nanicos.

A campanha do PT faz acusações violentas e infundadas contra Marina Silva. Isso dá resultado. Dilma começa a se recuperar e Marina a cair. Aécio tem uma recuperação lenta, mas contínua.

Dilma defendeu o diálogo com o Estado Islâmico, que decapita, estupra e fuzila em massa suas vítimas. Foi criticada por isso, mas a maior parte da população desconhece totalmente esse assunto. Marina, por sua vez, elogiou o impopular prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, como um exemplo de nova liderança.

Acontece o primeiro turno e, contrariando as pesquisas, Aécio tem grande vantagem sobre Marina e passa para o segundo turno. Consegue os apoios do PSB, de Renata Campos, viúva de Eduardo Campos, e de Marina Silva. Nas primeiras pesquisas, está à frente de Dilma. Com os ataques contínuos do PT, cai um pouco e Dilma passa à frente.

Villa narra cada um dos debates e publica na íntegra o último, na Globo. É muito interessante ter esse documento. Não nos esqueceremos de Dilma recomendando que uma economista desempregada fizesse um curso técnico no Pronatec. Nem da fala de Aécio: “Existe uma medida que está acima de todas as outras e não depende do Congresso Nacional. Para acabarmos com a corrupção no Brasil, vamos tirar o PT do governo.”

Villa relata o resultado final da eleição e acrescenta alguns comentários. Este trecho vale o livro:
«E mais uma vez, caso único na nossa história, tivemos como protagonista de uma eleição presidencial — pela sétima vez consecutiva — Luiz Inácio Lula da Silva. Ele representa o que há de mais atrasado na política brasileira. Tem uma personalidade que oscila entre Mussum e Stálin. Atacou as elites — sem defini-las — e apoiou José Sarney, Jader Barbalho e Renan Calheiros. Falou em poder popular e transferiu bilhões de reais dos bancos públicos para empresários aventureiros. Fez de tudo para que esta eleição fosse a mais suja da nossa história. E conseguiu. 
Sob o seu domínio — mais que liderança — o PT desmoralizou as instituições. A compra de maioria na Câmara dos Deputados, que deu origem ao processo do mensalão, foi apenas o primeiro passo. Tivemos a transformação do STF em um puxadinho do Palácio do Planalto. O Executivo virou um grande balcão de negócios e passou a ter controle dos outros dois poderes. Tudo isso foi realizado às claras, sem nenhum pudor. E teve influência direta no resultado da eleição de 2014.»
Quando Villa diz que esta foi a eleição mais suja da história, não posso deixar de me lembrar de que quase todas as eleições indiretas foram completamente manipuladas. Mas acho que ele se refere ao nível de ataques infundados contra adversários e de transgressões impunes à legislação eleitoral. É curioso que ele não diga nada sobre o uso político dos Correios na eleição que, se comprovado, resultaria na cassação dos mandatos de Dilma e de Michel Temer. Também não diz nada sobre as suspeitas contra as urnas eletrônicas e os relatos de problemas com elas, no primeiro e no segundo turnos.

Independentemente disso, Um País Partido é um grande livro, para ler e guardar.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Violência e Armas, de Joyce Lee Malcolm

Foi lançado recentemente no Brasil, pela Vide Editorial, Violência e Armas: A Experiência Inglesa, da Dra. Joyce Lee Malcolm, com apresentação de Bene Barbosa. No dia do lançamento, Bene deu uma palestra muito interessante. O livro é um estudo bastante abrangente da história da criminalidade e do controle de armas na Inglaterra e no País de Gales, levantando dados desde o século 13 até o final do século 20. A Inglaterra possui registros bem preservados sobre crimes e julgamentos desde a Idade Média. Também possui uma das legislações mais restritivas a armas em países democráticos. Portanto, é um excelente objeto de estudo para quem se interessa pela relação entre a criminalidade e a difusão das armas entre a população civil.

A Dra. Joyce, americana, professora da Universidade de Harvard, historiadora especializada no Império Britânico e na América Colonial, pesquisou as mudanças na legislação criminal inglesa, incluindo a evolução do conceito de legítima defesa, as normas referentes a armas brancas e de fogo e o custo das armas comparado à renda dos cidadãos comuns.

No século 13, ainda não havia armas de fogo. A criminalidade era alta, com taxas de homicídio entre 18 e 23 casos anuais por 100.000 habitantes. Esses números provavelmente são subestimados. A legítima defesa era reconhecida pela lei comum (common law). Porém, existia a necessidade de que quem fosse agredido tentasse fugir antes de recorrer à violência para que o caso fosse considerado legítima defesa. Havia algumas exceções. Por exemplo, matar um criminoso em fuga não era considerado homicídio. Não existia polícia. Todos os cidadãos eram obrigados a colaborar para a prevenção dos crimes e a captura dos criminosos.

No final do século 16, as armas de fogo se tornaram comuns entre os ingleses. As leis criminais foram endurecidas e seu alcance foi ampliado. Por outro lado, mais situações passaram a ser consideradas como legítima defesa. Ao final do século, a taxa de homicídios estava em torno de 10 casos anuais por 100.000 habitantes.

O século 18 estabeleceu a legislação mais dura da história da Inglaterra. Com a Lei Negra, praticamente qualquer tipo de crime levava à forca. Possuir armas continuou não sendo crime. Em 1800, as taxas de homicídio estavam chegando a 3,5 casos anuais por 100.000 habitantes.

A Revolução Francesa causou grandes preocupações ao governo inglês. Temia-se tanto uma tentativa de invasão das Ilhas Britânicas pela França como o surgimento de movimentos revolucionários dentro do Reino Unido. Houve iniciativas de coibir a posse de armas que pudessem ser usadas ilegalmente, mas isso não prosperou e as armas continuaram livres. 
No início do século 19, foi criada a polícia. Ela atuava desarmada, porque os ingleses temiam que ela fosse um instrumento de tirania. Somente os cidadãos podiam estar armados. A Dra. Joyce conta um incidente ocorrido, já no século 20, em 1909, conhecido como Tottenham Outrage, no qual policiais perseguindo assaltantes tomaram emprestadas as armas de quatro civis. Outros cidadãos armados cumpriram seu dever de lutar contra o crime juntando-se à perseguição.

O século 19 terminou com 1,5 homicídios anuais por 100.000 habitantes.

No século 20, o governo decidiu trabalhar, de maneira paciente e constante, para desarmar a população. A partir de uma primeira lei praticamente inócua em 1903, foram implantadas outras cada vez mais restritivas em 1920 e 1937, até que, em 1953, as armas foram banidas. Daí em diante, somente os criminosos estão armados. O livro explica bem como isso aconteceu, mas não diz exatamente por quê. Esse processo foi conduzido por sucessivos governos trabalhistas e conservadores. Da mesma maneira, o conceito de legítima defesa foi sendo cada vez mais limitado, até que fosse quase que completamente abolido. São narrados alguns casos assustadores de pessoas condenadas por homicídio por se defenderem de agressões que ameaçaram gravemente a vida delas.

A criminalidade cresceu de maneira consistente desde que as armas legais começaram a ser reprimidas. A Inglaterra tornou-se um lugar mais violento que os Estados Unidos. O livro termina com uma comparação entre a situação dos dois países. Cita o estudo do economista John Lott sobre as diferentes legislações de armas nos Estados Unidos e seu efeito sobre a criminalidade, concluindo que a liberdade de possuir e portar armas, inclusive escondidas, têm um efeito claro e demonstrável de coibir a criminalidade e a violência.

Senti falta de mais gráficos, especialmente das taxas de crimes ao longo da história ou, pelo menos, no século XX. O livro é uma fonte preciosa de informações para quem se interessa por combater a criminalidade e pela questão da proibição ou não da posse e do porte de armas. Mostra claramente que as restrições criadas na Inglaterra não tiveram o controle da violência como motivação e foram implementadas de maneira subreptícia, sem discussão com a sociedade e contrariando a tradição, a experiência e a lógica. Seu efeito foi totalmente negativo em todos os índices de violência e criminalidade. Excelente leitura.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Homenagem a D. Ruth Gomes de Sá

Quero fazer uma homenagem a uma pessoa muito especial: D. Ruth Gomes de Sá. D. Ruth é aposentada, tem 79 anos. Poderia estar em casa, cuidando dos netos ou das plantas, lendo Shakespeare ou Augusto Cury, assistindo à Sessão da Tarde, fazendo crochê ou jogando Candy Crush. Mas D. Ruth foi ao Congresso Nacional defender nossa liberdade.

Ela costuma ir ao Legislativo, assistir sessões parlamentares e defender suas opiniões políticas. Ficou revoltada com a maquiagem das contas públicas realizada pelo PLN 36/2014 e foi protestar no dia 2. Quando o Senador Renan Calheiros mandou esvaziar as galerias, com o pretexto de que a Deputada Vanessa Grazziotin teria sido desrespeitada pelo público, muitas pessoas se recusaram a sair. Uma delas foi D. Ruth. Foi abordada pelos policiais legislativos que lhe ordenaram que se retirasse. Respondeu: “Não saio!”

D. Ruth levou uma gravata e foi arrastada por vários metros. Foi solta porque um deputado interferiu. Voltou-se contra seu agressor e tentou dar um tapa nele.

Saindo do prédio, D. Ruth não foi para casa. Dirigiu-se à 5ª Delegacia de Polícia e prestou queixa. No dia seguinte, estava novamente na porta do Congresso para expressar sua revolta.

Obrigado, D. Ruth, por defender minha liberdade. O Brasil precisa de mais pessoas como a senhora.

P. S.: D. Ruth me lembrou deste texto: Um Discurso Inaugural, de Joseph Brodsky. Leiam.

Lobão, obrigado por não ter deixado o Brasil

Lobão, barrado na entrada do Congresso Nacional
Hoje, 3 de dezembro de 2014, o governo deu uma grande demonstração de sua natureza autoritária. Hoje, o povo foi impedido de entrar no Congresso Nacional, que é a casa do povo.

Uma das pessoas que esteve lá foi João Luiz Woerdenbag Filho, o Lobão. Tentou entrar como os outros brasileiros que pretendiam protestar contra a maquiagem imoral e ilegal das contas públicas da União, estabelecida pelo PLN 36/2014.

Ofereceram acesso a ele, com a condição de que ninguém mais entrasse. Chegaram a anunciar no plenário que ele entraria. Nesse momento, aqueles parlamentares que protestaram contra as vaias das galerias no dia anterior vaiaram Lobão. Ele recusou a proposta. Só concordaria com o acesso de todos.

Habeas Corpus impetrado por Lobão no STF
Saiu dali, foi à Procuradoria Geral da República e ao Supremo Tribunal Federal e impetrou um Habeas Corpus solicitando acesso ao prédio do Congresso Nacional. Depois, voltou para lá e se encontrou com líderes da oposição. O autoritarismo do governo precisa ser denunciado, exposto, evidenciado. Lobão é um brasileiro admirável. Lobão está fazendo sua parte. Lobão me representa.

De vez em quando, vejo gente cobrando de Lobão se ele não vai sair do país, como disse que faria se o PT vencesse as eleições. Costumo perguntar a essas pessoas se elas defendem o “Brasil, ame-o ou deixe-o” da ditadura militar. Não é necessário dizer que cada um livre para decidir o que fazer de sua vida, sair de seu país ou ficar nele, mudar de idéia, ter atuação política ou não. Pelo menos, por enquanto.

Quero agradecer ao Lobão por ter decidido ficar e lutar. Lobão está defendendo nossa liberdade. E nós, o que estamos fazendo?

Cadeirantes barrados no Congresso Nacional

Deputada Mara Gabrilli sendo entrevistada na Câmara dos Deputados,
em 02/12/2014, na preparação das atividade do Dia da Acessibilidade.
 A Deputada, que é cadeirante, protestou contra a arbitrariedade da Mesa.
3 de dezembro é o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência. Para comemorar essa data, a Câmara dos Deputados se propôs a realizar o Dia da Acessibilidade. Seria realizada uma cerimônia no Espaço do Servidor (Anexo 2), às 15h, em que a Câmara apresentaria os produtos e serviços implantados para torná-la cada vez mais acessível aos públicos interno e externo.

Apresentaria, porque nada disso aconteceu. Mais de 1000 pessoas portadoras de deficiência foram simplesmente impedidas de ter acesso ao Congresso Nacional. O governo, com medo da presença do povo na sessão que discutiu o ilegal e imoral PLN 36/2014, que promove a maquiagem das contas públicas da União, impediu que os visitantes adentrassem o prédio.

Não houve acessibilidade nem para cadeirantes, nem para caminhantes. Houve apenas o autoritarismo arreganhando seus dentes.

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Não é a mamãe, de Guilherme Fiuza

Ler Não é a mamãe: para entender a Era Dilma, de Guilherme Fiuza, foi um prazer masoquista muito semelhante ao que senti com Década Perdida, de Marco Antonio Villa. Foi até um pouco pior, porque li depois do resultado das eleições. Cada crônica é uma tragédia, uma oportunidade perdida pelo país. Sabemos que continuamos perdendo oportunidades todos os dias. Em cada coluna, a fina ironia nos força a rir das nossas desgraças.

O livro traz textos publicados em O Globo e na revista Época sobre a candidata e a presidente Dilma, do início de 2010 à metade de 2014. Cobre toda a primeira campanha eleitoral e quase todo o primeiro mandato. Como é possível que os brasileiros tenham escolhido uma figura tão vazia para o cargo eletivo mais importante do país? Como é possível que tenham tolerado bovinamente avalanches sucessivas de escândalos de corrupção e dado à presidente índices de popularidade estrondosos?

As crônicas expressam esse espanto. Em 2010, Dilma demonstra em um Congresso do PT sua total incapacidade de falar. Sua mediocridade é tamanha que os próprios militantes têm dificuldades de defender sua candidatura, mais ainda de se empolgar com ela. Repetidos crimes eleitorais acontecem, para os quais a Justiça Eleitoral faz vista grossa ou dá punições insignificantes. A campanha se desenvolve sobre mentiras. Emblemática da picaretagem é a apropriação da imagem de Norma Bengell na Passeata dos Cem Mil.

O blog oficial de Dilma Rousseff pegou esta foto:

Tonia Carrero, Eva Wilma, Odette Lara, Norma Bengell e
Ruth Escobar na Passeata dos Cem Mil

e fez esta montagem:


Guilherme Fiuza ressalta que Dilma é apresentada como uma heroína feminista, enquanto, na verdade, é o exemplo claro e acabado de uma mulher subalterna e subserviente a um homem que se comporta como seu dono. Dilma foi escolhida candidata porque Lula assim determinou. Em nenhum momento ela expressou qualquer opinião própria. O epíteto perfeito para uma pessoa sem conteúdo, segundo o autor, é “Mãe do PAC”. A expressão criada por Lula não significa nada e Dilma também não. “Não é a mamãe!”, diria o Baby Sauro.

Dilma é eleita e, no primeiro ano de governo, sete ministros caem. Seis por corrupção. Fernando Pimentel deveria ter sido o sétimo. Porém, Dilma conseguiu segurá-lo no cargo, enquanto preparava sua candidatura ao governo de Minas Gerais. Lamentavelmente, sabemos que ele conseguiu se eleger.

Em 2012, surge o escândalo envolvendo Rosemary Noronha. Fiuza a chama de “a mulher do ano”. “Por que só Dilma é ícone feminino, se Rosemary mostrou ser um prodígio da mesma escola?” Enquanto isso, Ricardo Lewandowski e José Antonio Dias Toffoli formam a dupla Batman e Robin do PT no Supremo.

O livro inclui a coluna Lula privatizou a si mesmo, sobre o pedido do Ministério Público Federal à Polícia Federal para que fosse aberto um inquérito contra Lula, com base na denúncia de Marcos Valério de que o ex-presidente teria intermediado um repasse de sete milhões de reais de uma operadora de telefonia para o PT. Publicada em julho de 2013, motivou um processo do PT contra Fiuza, por danos morais. Recentemente, o PT propôs uma audiência de conciliação sobre o caso, mas o jornalista não aceitou.

O livro segue com os protestos de 2013, a Primavera Burra, com os rolezinhos e com a morte de Santiago Andrade. Fiuza convida a Ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, a trocar as lentes dos seus óculos num shopping socialmente ocupado por um rolezinho. O “Brasil bonzinho”, que tolera arruaças de boçais mascarados, foi o responsável pelo assassinato do cinegrafista da Band. “Deputados bonzinhos, intelectuais do bem e artistas antenados gritaram alto pela liberdade dos presos em manifestações.” “Esse Brasil progressista que matou Santiago se permitiu hesitar diante da afronta ao estado de direito. Confundiu atentado com protesto e resolveu (embora jamais vá confessar isso) relativizar a violência. Assassino.”

Guilherme Fiuza previu que Dilma seria reeleita. Ainda estou tentando entender como ou por quê. Seja como for, precisamos defender a liberdade que ainda temos.

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Cenas de um lançamento

Estive nesta segunda-feira no lançamento de Objeções de um Rottweiler Amoroso, de Reinaldo Azevedo, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional. É o quinto lançamento de um livro dele a que eu compareço. Cada um mais lotado que o anterior.

A Cultura poderia ter organizado melhor o evento. Cheguei cedo e fui direto ao caixa, onde havia uma fila razoável. Quando finalmente fui atendido, descobri que a fila era para comprar outro livro que também estava sendo lançado, Por uma vida mais doce, de Danielle Noce. Os do Reinaldo estavam só no último andar. Lá em cima, uma fila maior, que andava menos e só um caixa aberto. Atrás de mim, dois sujeitos conversando. Um deles com uma camiseta de Zumbi. Falavam de Markus Sokol, O Trabalho, MPL e a maldade das elites. Foi uma longa espera.

Comprei meus livros e fui para o fim da fila dos autógrafos, que descia a escada, saía pelos fundos da livraria e terminava no começo da rampa. Ocupei meu lugar e vi a fila crescer descendo a rampa inteira e sair pela Alameda Santos afora. Pessoas muito diferentes entre si, de idades diversas, falando de assuntos diversos, fazendo novas amizades. Também fiz alguns novos amigos lá.

Então, começamos a andar e, lentamente, subimos a escada. Chegando de volta ao último andar, vi o Tutinha, da Jovem Pan, fotografando a gente. Um sujeito de fala mole estava falando com ele, dizendo que achava o título do livro muito agressivo. Eu disse que o título era uma resposta à agressão que o Reinaldo sofreu. Ele falou que se espantava de que tanta gente viesse procurar um autógrafo do autor de um livro que não tinham lido. Respondi que já li os textos do livro. Saem na Folha há um ano, caramba! Ele veio com aquela conversinha de perguntar se o Reinaldo atacava só o governo ou também tinha criticado Aécio Neves e foi citando denúncias com aquela fala mole, que não consegui entender. Antes que eu pudesse responder, ele disse que achava aquele clima parecido com o da Alemanha de 1939. Falei que não dava para conversar com alguém que quer me ofender, que não admito ser chamado de nazista. Ele pediu desculpas, mas não me deixou responder mais nada. Meus amigos acharam que o sujeito estava bêbado.

Cheguei então à mesa, onde Reinaldo, sempre muito simpático, autografou meus onze livros. Nessa hora, Marco Antonio Villa chegou para lhe dar um abraço. Falei que era uma pena eu não ter levado Ditadura à Brasileira para pegar um autógrafo. Ele disse que estará na Cultura da Paulista na segunda, 1º de dezembro, para lançar Um País Partido: 2014 - A Eleição Mais Suja da História.

Me despedi do Reinaldo e do Villa e desci seguindo a fila, para procurar alguns amigos. Estavam ainda na calçada da Alameda Santos. Não cheguei a ver onde a fila terminava. Conversei um pouco com eles e vim embora.

No dia seguinte, entreguei os livros que os colegas de trabalho tinham encomendado. Mas fiquei surpreso com dois colegas que não tinham pedido o livro. Um era filiado ao PT até não muito tempo atrás (como o Reinaldo também foi, ele me diz). Hoje, ouve Os Pingos nos Is e pegou o livro para dar uma olhada. O outro costuma ir trabalhar usando uma camiseta com a bandeira de Cuba e me convidou uma vez a assinar um abaixo-assinado pelo financiamento público de campanha. Mas começou recentemente a ouvir o Reinaldo no rádio. Ficou interessadíssimo no livro e vai comprar um para ele.

A cada dia, mais pessoas estão descobrindo a importância de defender a liberdade.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Publicidade infantil: uma pequena história pessoal


Aproveitando que o tema da redação do ENEM foi a publicidade infantil, vou contar uma pequena história familiar sobre esse assunto.

Tenho uma filha e um filho pequenos. Dou a eles uma pequena mesada, para que vão aprendendo a lidar com dinheiro. Como normalmente não gastam tudo durante o mês, sobra dinheiro para comprarem um presente de Natal para eles mesmos no final do ano. É sempre uma grande satisfação ter embaixo da árvore de Natal um presente que eles compraram para si mesmos, com cartãozinho e tudo.

Em agosto de 2011, minha filha via na TV propagandas do site da Escola de Princesas da Barbie. Me pediu para cadastrá-la e começou a fazer as “aulas”. O site tinha um calendário de atividades de três semanas. Ela foi acompanhando todas com entusiasmo. Na última semana, o site convidava as “alunas” a pegarem um certificado em uma loja de brinquedos. Ela ficou ansiosa para ir até lá. Nós tínhamos mesmo programado ir ao shopping naquele dia por algum motivo. Fizemos o que ela pediu.

Aí é que vem a pegadinha. A vendedora disse que, além do certificado, ela poderia receber um capelo (chapéu de formatura) da Escola de Princesas da Barbie. Mas, para isso, tinha de comprar uma boneca da coleção. O capelo era de cartolina. A boneca mais barata custava todo o dinheiro que minha filha tinha guardado. Deixei que ela decidisse o que fazer. Ela comprou a boneca e levou para casa o capelo. Ficou toda feliz na hora. Acho que nunca brincou com essa boneca. O capelo ficou jogado para lá e para cá por algum tempo e acabou indo para o lixo. Ainda era setembro, faltava um pouco de tempo até o Natal. Economizando a mesada inteira, ela conseguiu comprar um presente de Natal para si mesma, mais barato que o do ano anterior.

Minha filha aprendeu que existe publicidade e como funciona. Aprendeu que podemos nos arrepender daquilo que fazemos por impulso. Não esqueceu essa lição.

Neste feriado, fomos fazer compras no shopping. Foi muito engraçado ver adultos se matando para conseguir um McLanche Feliz com o bonequinho do Mario e meus filhos desprezando os bonequinhos completamente.

Acho que a única maneira de ensinar alguém a ter responsabilidade é dar responsabilidade, permitir que a pessoa faça suas escolhas e, na medida do possível, arque com as conseqüências das suas decisões. Não quero criar meus filhos em uma redoma de vidro. Não acho que proibir a publicidade infantil contribua para formar adultos melhores.


sábado, 15 de novembro de 2014

A imprensa e as manifestações de 15 de novembro

Como no dia 1º, cidadãos saíram as ruas, em diversas cidades brasileiras, para defender a democracia e a liberdade e protestar contra o governo. As manifestações foram muito maiores e mais numerosas desta vez. Quantas pessoas protestaram? Em quantas cidades? Não sabemos. Não saberemos.

Infelizmente, a imprensa não cobre as manifestações. As pessoas que exigem investigação dos escândalos, respeito à liberdade de imprensa e fim do apoio a ditaduras estrangeiras estão sendo ignoradas, escondidas e caricaturadas. Distorce-se a pauta do movimento. Acusa-se de golpistas aqueles que clamam por transparência no processo eleitoral e responsabilização efetiva dos envolvidos em gigantescos esquemas de corrupção. Subestima-se o número de participantes das passeatas contra o governo e superestima-se a quantidade de gente (muitas vezes paga ou coagida) em eventos orquestrados a favor. Ou se ignora completamente que uma multidão está protestando.

O Jornal Nacional, aparentemente, não considerou notícia os eventos. Não assisti, cheguei em casa quando já tinha terminado. O site do JN não faz nenhuma referência a protestos.

A Reaçonaria reportou aqui como foi o dia na Paulista e mostrou fotos de Brasília, Goiânia, Natal, Porto Alegre e Recife. Apareceu em São Paulo um caminhão de som com cartazes pedindo intervenção militar. A Reaçonaria tuitou isto:







A cobertura da Folha é totalmente contrária aos manifestantes, inteiramente calcada nos pedidos de intervenção militar. Também noticia qualquer protesto contra Geraldo Alckmin, com qualquer quantidade de gente, com o mesmo peso que dá aos milhares (“cerca de mil”…) que estiveram na Paulista. A cada dia, o jornal demonstra que Washington Olivetto tinha razão.

O Estadão foi mais equilibrado, relatando que havia quatro grupos e quatro carros de som. Um deles defendia intervenção militar, o que foi rejeitado pelos outros três. Segundo o jornal, houve uma batalha de microfones na concentração. Mencionam-se pequenos protestos em Brasília, Rio e Belo Horizonte. Não se fala nos que ocorreram em dezenas de outras cidades brasileiras.

Gostei bastante da cobertura deste site aqui, que vi pela primeira vez hoje: www.ultimoinstante.com.br. Outra fonte preciosa são colunistas como Reinaldo Azevedo e Felipe Moura Brasil. Este último escreveu este post sobre a completa ausência do Foro de São Paulo no noticiário. O Foro de São Paulo, entidade fundada por Lula e Fidel Castro em 1990, que congrega diversos partidos bolivarianos e algumas organizações criminosas ligadas ao narcotráfico é denunciado sistematicamente por Olavo de Carvalho há décadas e é ignorado sistematicamente por quase toda a “mídia golpista”, como dizem os petistas, desde então.

Não tenho como acompanhar a imprensa inteira, mas fica claro quando se olham os principais veículos, que não é por meio deles que conseguiremos saber o que está acontecendo atualmente no Brasil. 

domingo, 9 de novembro de 2014

A Queda do Muro de Berlim

Alemães celebram o fim do Muro de Berlim
Há 25 anos, no dia 9 de novembro de 1989, uma página vergonhosa da história humana foi virada. A queda do infame Muro de Berlim é o maior símbolo do colapso dos regimes totalitários comunistas do Leste Europeu.

Depois da Segunda Guerra Mundial, o território alemão foi dividido em quatro zonas de ocupação, cada uma controlada por uma das potências aliadas: Estados Unidos, França, Reino Unido e União Soviética. Berlim, que era a sede do Conselho de Controle Aliado, foi dividida da mesma maneira, embora ficasse totalmente na área controlada pelos soviéticos. Em pouco tempo, os ocupantes não soviéticos concordaram em unir suas áreas em um país reconstruído e os soviéticos decidiram isolar sua parte, formando-se assim a Alemanha Ocidental e a Alemanha Oriental. Berlim Ocidental tornou-se um enclave livre dentro da Alemanha Oriental comunista.

Para impedir que os alemães orientais fugissem do país, as fronteiras com a Alemanha Ocidental foram fechadas e foi construído o Muro. Antes dessas barreiras, cerca de três milhões e meio de alemães conseguiram sair para o oeste. Isso equivale a 20% da população do país.

Em 1989, o comunismo caiu sucessivamente na Polônia, Hungria, Alemanha Oriental, Bulgária, Tchecoeslováquia e Romênia. Manifestações de protesto varreram a Alemanha Oriental a partir de setembro. Primeiro, o grito de ordem dos manifestantes era “Queremos sair!” Em pouco tempo, mudou para “Queremos ficar!” Erich Honecker, Secretário Geral do Partido Socialista, renunciou em 18 de outubro. Em 4 de novembro, houve a maior de todas as manifestações por liberdade, reunindo 500.000 pessoas na Alexanderplatz. Muita gente estava fugindo do país pela Hungria. Em 9 de novembro, o governo decidiu não mais impedir que as pessoas cruzassem as fronteiras entre as duas Alemanhas, incluindo o Muro.

O responsável pelo anúncio dessa medida, Günter Schabowski, não sabia que o governo pretendia que ela entrasse em vigor somente no dia seguinte, para dar tempo de que os guardas se preparassem. Disse à imprensa que a emigração estava liberada imediatamente. Isso foi a principal notícia da noite na TV da Alemanha Ocidental, assistida também por alemães orientais. Uma multidão acorreu ao Muro exigindo sair, “como Schabowski havia dito”. Os soldados não tiveram como segurá-los. Foram recebidos por alemães ocidentais com flores e champanhe. Logo uma multidão de alemães ocidentais e orientais dançava sobre o Muro para celebrar a liberdade.

O progresso, a liberdade e a prosperidade não vieram de maneira igual em todos os países ex-comunistas. Em alguns lugares, como Alemanha, Polônia e República Tcheca, a economia cresceu enormemente e a liberdade é um valor sólido e arraigado. Em outros, como Hungria e Eslovênia, depois de um início promissor, o progresso diminuiu muito seu ritmo. Na Rússia, infelizmente, a democratização foi abortada. O país deixou de ser comunista, mas não deixou de ser uma ditadura. Existem países como a Ucrânia e a Romênia, em que as reformas vem acontecendo de maneira gradativa desde o início e outros como Belarus e Uzbequistão, em que quase nada mudou.

A liberdade é um bem precioso. Aqui, em Berlim, em Amsterdã ou em Havana. Hoje, comemoramos o aniversário de uma grande conquista. Não podemos nos esquecer nunca de que seu preço é a eterna vigilância. Hoje, também sou um berlinense.

sábado, 1 de novembro de 2014

As Manifestações de 1º de Novembro

Seis dias depois do segundo turno das eleições presidenciais, houve protestos contra o PT em diversas cidades do Brasil. O maior deles foi em São Paulo, com cerca de 20.000 pessoas, pela estimativa de quem esteve lá. Manifestantes também marcharam em Porto Alegre, Curitiba, Brasília, Belo Horizonte, Campo Grande, Goiânia. Alguns sites falam em protestos em 28 cidades. É difícil dizer quantas pessoas participaram em cada lugar. Os principais veículos da imprensa dão estimativas muito aquém da realidade de São Paulo e ignoram completamente as outras cidades.

A pauta das manifestações é composta de quatro pontos:

1) Respeito à liberdade de imprensa.
Depois dos recentes ataques à revista Veja por causa das reportagens sobre o escândalo na Petrobras e de todas as tentativas de cerceamento da imprensa durante os governos do PT, é necessário apoiar e defender a liberdade de imprensa no Brasil.

2) Investigação do uso político dos Correios nas eleições.
Há indícios de que o Partido dos Trabalhadores se utilizou de uma estatal para obter vantagens ilícitas em uma eleição. Se o crime for comprovado, isso é base para a impugnação da candidatura de Dilma Rousseff.

3) Fim do apoio do governo do Brasil a ditaduras e fim do financiamento de obras em países que não respeitam os direitos humanos de sua população.
O Brasil governado pelo PT demonstrou apoio e estabeleceu cooperação com diversas ditaduras, especialmente a cubana e a venezuelana. Suas lideranças recebem dinheiro brasileiro por meio de financiamentos do BNDES e do programa Mais Médicos. Essas ligações são suspeitas do ponto de vista estratégico e financeiro e constituem uma grave ameaça à nossa democracia.

4) Prisão e cassação dos direitos políticos de todos os envolvidos com o escândalo na Petrobras.
O escândalo do Petrolão, assim como o do Mensalão, não é um simples caso de corrupção, mas uma tentativa de golpe de estado. Os responsáveis por este crime contra as instituições democráticas brasileiras devem ser punidos até as últimas conseqüências.

Acreditando que seja possível comprovar definitivamente a responsabilidade da presidente Dilma Rousseff pelos crimes do Petrolão, os manifestantes defendem a abertura de um processo de impeachment contra ela.

Não houve incidentes em nenhuma das cidades. Diferentemente das badernas de junho de 2013, que sempre, como é mesmo?  “começavam pacíficas”, mas eram “infiltradas por vândalos”, ninguém quebrou nada, ninguém atacou a polícia, não aconteceu nenhum tipo de confronto nem de destruição de patrimônio público ou privado.

É um momento muito particular este que vivemos. Pela primeira vez desde 2002, as pessoas estão de fato mobilizadas para resistir contra o governo. Apesar da vitória nas eleições, o PT nunca esteve tão fraco e acuado. As pessoas parecem estar realmente cansadas de mentiras, desmandos, autoritarismo e desrespeito. Não se sentem representadas pela oposição tíbia e hesitante que tivemos durante estes 12 anos e não querem mais esperar. Pretendem fazer alguma coisa para defender sua liberdade agora, não depois. Aliás, o PSDB já se apressou em dizer que não tem mesmo nada com isso.

Salta aos olhos a tentativa da imprensa em geral de abafar ou deturpar o que aconteceu ontem. O Jornal Nacional não fez menção aos protestos. O Globo, a Folha e o Estadão dividem por dez ou vinte o número de participantes e publicam fotos que fazem parecer que a Paulista está vazia. Entre tantas pessoas com tantas faixas diferentes, a Folha e o Estadão conseguiram entrevistar o mesmo cidadão que pedia “intervenção militar”. Será que é isso o que queria o restante da multidão? No UOL, a manchete é “São Paulo tem atos contra Dilma e Alckmin”, referindo-se aos 200 petistas que foram ao Largo da Batata promover o ato “Alckmin, cadê a água?”, dispersado pelo temporal que caiu à tarde. Sem dúvida, 200 petistas são tão ou mais importantes que 20.000 indivíduos sem partido. Com inimigos como esses, o governo não precisa de amigos.

Não sei se esse movimento vai continuar e ganhar força, mas é inédito. O governo certamente está assustado. Eles tem fontes de informação melhores que o Jornal Nacional e a Folha de S.Paulo.
Porto Alegre

Monumento às Bandeiras, em São Paulo



Curitiba

Campo Grande


Foto da Folha, do trecho final da manifestação, dando a impressão de que a
Paulista está vazia.

Foto de O Globo, no mesmo estilo.



Manifestação contra Fernando Henrique Cardoso, em 1999. Quem é golpista?

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

O que dizer depois das eleições

Há várias coisas que precisam ser ditas agora que as eleições acabaram.

Em primeiro lugar, é preciso ressaltar que as pessoas são livres para fazerem o que quiserem. São livres para votar no governo, na oposição, em branco ou se absterem. Pelos motivos que quiserem. Também são livres para gostar ou não do resultado, comemorar, colocar luto, querer sair do país ou ficar e resistir. Ninguém é obrigado a concordar comigo. Se eu quero obter a concordância de alguém, preciso convencê-lo. Tenho um respeito profundo pela liberdade de cada um fazer suas escolhas.

Minha escolha é ficar e resistir. Já não é hora para luto, mas para a luta. São muitas as ameaças contra a nossa liberdade. Precisamos defendê-la e precisamos começar agora.

Os governistas vão tentar nos impingir sua agenda autoritária. Querem forçar uma reforma política que os perpetue no poder. Os ataques contra a imprensa vão se intensificar. Não há dinheiro para cobrir os gastos do governo e haverá iniciativas para aumentar os impostos. Apesar de derrotada há nove anos, a tese do desarmamento continuará nos assombrando.

Temos de denunciar cada medida de restrição de liberdade. Temos de lembrar aos parlamentares que elegemos que fomos nós que os escolhemos e para quê.

Uma frente importantíssima de luta é a indicação dos Ministros do Supremo Tribunal Federal. Esperam-se seis nomeações durante o próximo mandato presidencial. Alguém imagina um STF com seis Lewandowskis ou seis Dias Toffolis? Os senadores terão de exercer uma atribuição que sempre foi negligenciada, de questionar os indicados e barrar aqueles que estarão comprometidos com o partido do governo e não com a defesa da Constituição.

As denúncias de crimes nas estatais e nos órgãos de Estado precisam ser severamente investigadas e levadas às últimas conseqüências. A oposição não pode repetir os erros de 2005, quando se furtou à sua responsabilidade perante o país e permitiu que crimes gravíssimos contra a democracia ficassem impunes.

Ao mesmo tempo, passamos por um momento ruim no cenário econômico. A condução da política econômica vem sendo feita de forma amadora e procurando-se maquiar dados. Não se enfrentam os problemas. É preciso exigir transparência nas questões econômicas e denunciar e combater cada caso de contabilidade criativa.

Não podemos investir na divisão do país. Pelo contrário, precisamos aglutinar o maior número de pessoas contra quem quer nos dividir. Conheço pessoas muito pobres que votaram na oposição. Conheço pessoas muito ricas que votaram no governo. Tenho vários amigos e parentes, cuja amizade prezo muito, que têm opiniões políticas radicalmente diferentes das minhas, pelas razões mais diversas. Existem pessoas que votaram no governo por medo, ou por desconhecimento de determinados fatos. Outras estão descontentes com a situação, mas não identificam as causas desse descontentamento. É necessário dialogar e convencer, sempre que houver abertura para isso. E criar aberturas onde elas não existem.

A distribuição dos votos em todo o país é muito misturada. Em Santa Catarina, o estado mais oposicionista, um em cada três votos válidos foi para o governo. No Maranhão, o estado mais governista, quase um em cada quatro votos válidos foi para a oposição. Seja como for, meus vizinhos não são responsáveis por meus erros, nem eu pelos deles. Somos todos indivíduos. Nacionalismo, bairrismo e racismo são manifestações extremas de ignorância. Como dizia Ayn Rand, um gênio é um gênio, independentemente de quantos idiotas nasceram no mesmo lugar que ele, e um idiota é um idiota, independentemente de quantos gênios partilham da mesma origem geográfica ou familiar. 

Nesta eleição, 70% das pessoas desejavam mudança. Não aconteceu e muita gente está frustrada. Quem defende a liberdade precisa falar a essas pessoas, propor ações, discutir o que está errado e resistir contra quem quer nos dividir e controlar. Por outro lado, embora vitorioso, o governo nunca esteve tão fraco. O resultado da votação foi apertadíssimo, os partidos governistas perderam espaço no Congresso, houve grandes derrotas em Estados importantes. Os petistas estão com vergonha ou com medo. Estavam acostumados a serem a única opinião pública e não são mais. Existe uma onda a favor da liberdade e contra o governo, que ficou evidente nas urnas, embora o governo tenha ganho por margem mínima.

A eleição já é passado. No presente, temos muito a fazer. Defendamos nossa liberdade!

sábado, 25 de outubro de 2014

O que fazer em caso de problema na urna eletrônica

Isto é sério e importante. Houve diversos relatos, no primeiro turno, de problemas diversos em urnas eletrônicas. Muitos eleitores ficaram em dúvida se seu voto foi computado ou não. Outros, de fato, afirmam que não conseguiram votar em quem desejavam.

Consultei uma amiga advogada sobre os procedimentos que o eleitor deve adotar em caso de problemas na urna eletrônica. Publico abaixo a resposta dela:

Primeiro, o eleitor deve chamar o mesário é pedir para que ele registre em Ata que ocorreu a irregularidade, descrevendo os fatos. O mesário não pode se recusar. Se isso acontecer, o eleitor deve chamar o presidente da mesa e o juiz eleitoral. Ninguém vota enquanto o problema não for registrado. O eleitor não deve confirmar seu voto, porque o mesário vai ter que registrar que ele não conseguiu votar, e isso identificará o problema naquele momento.

IMPORTANTE: o advogado do candidato ou do partido tem de ser comunicado imediatamente, através do delegado ou do fiscal que estiver na Zona eleitoral em que houve a ocorrência. O prazo para o recurso é imediato! Ou seja, reclamado o problema e ignorado pelo mesário ou presidente da mesa, imediatamente se exige um recurso técnico para o juiz eleitoral, que, por decisão imediata, defere ou indefere. E o recurso ao TRE também deve ser imediato.

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Palestra de Bene Barbosa, no lançamento do livro Violência e Armas

A Vide Editorial lançou o livro Violência e Armas: A Experiência Inglesa, da pesquisadora americana Joyce Lee Malcolm. O prefácio é de Bene Barbosa, presidente do Movimento Viva Brasil. Bene deu uma palestra para apresentar o livro, em São Paulo, no dia 7 de outubro.

O tema do desarmamento é um daqueles cujo debate é interditado no Brasil. Se enquadram nessa categoria a responsabilização penal de menores de 18 anos, a descriminação das drogas, as cotas raciais e muitos outros. A imprensa, em geral, age como se houvesse um consenso envolvendo toda a sociedade, e não dá praticamente nenhum espaço para as vozes discordantes. É o chamado multilateralismo de um lado só.

A Vide Editorial decidiu entrar nessa arriscada seara, com uma obra que expõe uma visão diferente da questão. Optou pelo livro da Dra. Joyce, que estudou a relação entre armas e criminalidade na Inglaterra, desde a Idade Média até o século 20, considerando o efeito de guerras, de variações econômicas e de mudanças na legislação penal.

Bene Barbosa está envolvido com a discussão sobre o desarmamento há muito tempo. Em 1986, com 16 anos, se interessou por um editorial de uma revista especializada em armas, escrito em forma de carta de um pai a um filho. O pai dizia que havia comprado uma arma de presente para o filho, mas pedia que este jamais revelasse o fato a ninguém. Bene ficou intrigado com isso. Estudou muito tentando entender por que existe essa ampla mobilização contrária a posse e ao porte de armas pelo cidadão respeitador das leis. Concluiu que o desarmamento é uma doença da sociedade. Se não tivermos o diagnóstico correto desse mal, não encontraremos nunca a cura.

É muito fácil perceber que a única maneira de parar um malfeitor armado é ter outra pessoa armada em seu caminho. Recentemente, em Oklahoma, um homem de 30 anos, recém convertido ao islamismo, atacou os funcionários de seu antigo local de trabalho com uma faca. Degolou a sra. Colleen Hufford, de 54 anos, e esfaqueou várias vezes a sra. Traci Johnson, de 43 anos. Em seguida, foi baleado pelo presidente da empresa, Mark Vaughan. Se Vaughan não estivesse armado, o assassino continuaria o massacre pelo tempo que quisesse.

Em 2012, um homem vestido de Coringa disparou contra o público que assistia Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge em um cinema em Aurora, no Colorado, matando 12 pessoas e ferindo 70. Havia um shopping ao lado da casa do assassino, passando o mesmo filme, com uma sala maior e lotado. Porém, o criminoso escolheu dirigir por 20 minutos para ir até uma sala do Cinemark. Por quê? Porque o Cinemark proíbe seus espectadores de entrar portando armas. O assassino tinha certeza de que seria a única pessoa armada na sala.

A palestra falou menos sobre o livro e sobre a Inglaterra, focando-se mais na história do desarmamento no Brasil. Sobre o caso inglês, Bene disse que a Dra. Joyce demonstra que o desarmamento provocou uma escalada do crime, levando o país a se tornar o mais violento da Europa, depois de ter tido taxas baixíssimas de criminalidade quando as armas eram livres. É freqüente, hoje, que um policial desarmado, de bicicleta, aborde um suspeito e descubra um criminoso com uma metralhadora. O objetivo do controle de armas é, e sempre foi, o controle social de algum grupo. Os católicos foram impedidos de ter armas em certos momentos. Os ingleses desarmaram a Índia quando a colonizaram. O estopim da Revolução Americana foi a tentativa da metrópole de desarmar as colônias na América.

No Brasil Colônia, os portugueses puniam com a morte os brasileiros que fabricassem armas. A preocupação, evidentemente, não era com a criminalidade, mas com o controle social. Com a nossa Independência, foi criada a Guarda Nacional e extintas as milícias de cidadãos. É exatamente o contrário do que foi feito pelo Bill of Rights, nos Estados Unidos. Os americanos declararam que a responsabilidade pela defesa da Constituição e da integridade nacional é de todos os cidadãos que, para essa finalidade, podem constituir milícias armadas. Como disse Bene, o Império Brasileiro declarou que a defesa da Constituição era atribuição exclusiva do Papai-Estado. Nesse período, os brasileiros de pele branca podiam possuir armas. Os negros, mesmo libertos, eram proibidos. A única exceção eram os capitães-do-mato. Mais uma vez, ninguém estava preocupado com o crime. O que se pretendia era evitar potenciais rebeliões de escravos.

No início da República, dois fenômenos marcam o interior do Brasil: o coronelismo e o cangaço. Os coronéis montavam grandes forças de jagunços, com capacidade militar muito superior à do Exército. E o cangaço era um flagelo que se abatia sobre a população. O governo usou o argumento de que era necessário desarmar os coronéis para evitar que suas armas caíssem nas mãos dos cangaceiros. Isso soa familiar, não? Ouvimos hoje que é necessário desarmar os cidadãos para evitar que suas armas caiam nas mãos dos criminosos. Era falso então e é falso hoje. A principal fonte de armas para o crime não é, nem nunca foi o roubo.

Mas os coronéis foram enganados e muitos entregaram seu arsenal ao governo. Lampião agradeceu a colaboração das autoridades com sua atividade. Não havia mais quem se opusesse a ele. O único lugar que resistiu a Lampião sem ajuda militar foi Mossoró. O bando atacou a cidade em 1927 e foi recebido a bala pelos cidadãos armados e organizados, que prenderam e justiçaram o líder cangaceiro José Leite de Santana, o Jararaca.

Na época da Revolução de 32, não havia armas restritas. Os cidadãos podiam ter qualquer tipo de armamento. A polícia de São Paulo possuía tanques e aviões de combate. O ditador Getúlio Vargas sentiu na prática o perigo de haver armas de qualquer tipo à disposição de rebeldes em potencial e emitiu o Decreto 24.602, em 06/07/1934, restringindo calibres e tipos de armamento.

Mais recentemente, os governos Fernando Henrique, Lula e Dilma criaram os Planos Nacionais de Direitos Humanos nº 1, 2 e 3, respectivamente. Cada um mais restritivo que o anterior, atingindo inclusive os agentes de segurança públicos e privados, os colecionadores e os atiradores esportivos. Fernando Henrique conseguiu a aprovação da Lei 9.437, que restringiu a posse e o porte e transformou em crime a posse e o porte ilegais. Lula conseguiu a aprovação do Estatuto do Desarmamento, a Lei 10.826/03.

Foi convocado o Referendo de 2005, que recebeu como resposta um sonoro NÃO da população. Os desarmamentistas acreditaram em pesquisas manipuladas por desarmamentistas e imaginaram que o povo partilhava de seus falsos raciocínios. Seus argumentos foram completamente desmontados nas discussões que antecederam o Referendo. Bene conta que participou de um debate com Luiz Eduardo Greenhalgh, em um sindicato. Quando o evento terminou, muitas pessoas presentes, de um público a princípio hostil, o procuraram para tirar fotos, pedir autógrafos, manifestar apoio. Nesse dia, ele percebeu que não havia como perder nas urnas. Desde o Referendo, não houve novas restrições às armas. Mas os desarmamentistas não desistem.

A bancada contrária ao desarmamento tem crescido enormemente. Eram apenas 8 deputados em 2005. São mais de 100 na legislatura atual e, no Congresso eleito, serão muitos mais. É um fato evidente que o desarmamento não trouxe os efeitos que prometeu. E está tramitando o PL 3722/12 que, se aprovado, será o primeiro passo no sentido contrário ao que o Brasil percorreu até aqui.

A luta é longa. Como diz Bene, “o que está em jogo não é o direito de possuir armas. O que está em jogo é a nossa liberdade!” Defendamos nossa liberdade!

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

O Deus da Máquina, para download

Está disponível para download o livro O Deus da Máquina, de Isabel Paterson, em português, em formato pdf. E também o original em inglês, The God of the Machine.





Prefácio

Que interesse pode despertar um livro escrito há mais de 70 anos, por uma autora pouco conhecida até nos Estados Unidos, que não teve educação formal e que usa metáforas difíceis, tiradas da engenharia mecânica, elétrica e da arquitetura? Quando vi este texto, fiquei fascinado. É uma afirmação apaixonada da liberdade. É também uma fundamentação teórica muito bem construída dos valores políticos em que acredito. Foi escrito num momento em que a liberdade estava em baixa em todo o mundo e muito poucas pessoas se dispunham a defendê-la.

Por isso, resolvi traduzir O Deus da Máquina para o português e tentar fazê-lo mais conhecido. Estão nesta edição todos os grifos e todas as notas de rodapé que Isabel Paterson colocou no original. Acrescentei notas explicativas sempre que achei necessário, para identificar figuras e fatos históricos, citações a outros textos e para esclarecer as metáforas muito particulares que a autora criou. Procurei ter o máximo respeito por seu estilo e sua linguagem. É claro que discordo dela em alguns pontos, mas não exprimi essas divergências em minhas notas de rodapé.

Para Isabel, são três as idéias sobre as quais foi construída a civilização ocidental: a ciência dos gregos, a lei dos romanos e a individualidade dos cristãos.

Os gregos perceberam que o conhecimento tinha valor por si mesmo. Não estavam preocupados com a aplicação da ciência. Entendiam que era possível utilizar o conhecimento obtido em uma área para resolver problemas encontrados em outras, que essa busca levava o homem na direção da verdade e que isso era um bem, independentemente da utilidade prática dessa verdade.

Politicamente, a democracia grega revelou-se extremamente instável, suscetível às arbitrariedades das maiorias de ocasião. A República Romana, por outro lado, estabeleceu uma legislação construída em bases racionais. Não era uma lei divina e imutável. Era uma lei humana, falível e passível de ser melhorada. Criou uma estrutura de Estado com um sofisticado mecanismo de freios e contrapesos. Essa legislação estava muito longe de ser perfeita e, em muitos casos, era quase bárbara. Porém, pelo simples fato de existir e se aplicar indistintamente a todos, criou um ambiente de confiança e estabilidade que fez com que Roma perdurasse por tantos e tantos séculos e dominasse o mundo.

O cristianismo tem como um de seus pilares a crença de que o ser humano possui uma alma individual e imortal. Um indivíduo não é responsável pelos atos de outro e não pode ser premiado ou punido por causa deles. O Império Romano foi a sociedade mais avançada da Antigüidade. Chegou perto de colocar essas três idéias em prática, juntas. Mas ruiu com o peso de seus domínios antes que isso se concretizasse. De qualquer maneira, essas idéias permeiam nossa cultura. A Humanidade teve de esperar muitos séculos até que fossem novamente reunidas e se transformassem numa experiência de liberdade e progresso.

A descoberta da América criou um laboratório de experiências sociais. Os europeus travaram contato com povos então desconhecidos, em diversos estágios de desenvolvimento social, e estabeleceram colônias que conviviam e interagiam com esses povos. As riquezas da América, despejadas sobre a sociedade rígida da Espanha, criaram um curto-circuito e esfacelaram o Império espanhol. A Inglaterra, que já era um país mais livre que as outras nações européias, desde a Magna Carta, permitiu que se criasse um ambiente de notável liberdade em suas colônias americanas. Seus habitantes, em grande parte refugiados de perseguições religiosas, políticas ou étnicas, viviam de maneira surpreendentemente harmoniosa. Os problemas que dividiam os diferentes grupos na Europa não foram resolvidos, simplesmente evaporaram.

Isso provocou estupefação no Velho Continente. Como era possível existirem selvagens, sem governo, que vivessem razoavelmente em paz? Como a liberdade podia funcionar nas colônias? A Europa era capaz de conceber que a sociedade pudesse funcionar minimamente sem um governo forte. Então, passou a acreditar que os selvagens do Novo Mundo eram seres humanos muito superiores aos que eles conheciam na Civilização. Surgiu assim a figura do Nobre Selvagem e a idéia européia de que a sociedade corrompe o ser humano, originalmente puro no estado de Natureza. Uma diferença marcante entre o pensamento americano e o europeu é que os americanos acreditam na liberdade do indivíduo, um direito nato e inalienável, enquanto os europeus acreditam em “liberdades”, ou seja, permissões dadas pelo governo em situações determinadas.

Sobre a função do governo, Isabel diz que ele é única e exclusivamente um freio à ação humana. Freios são necessários e extremamente importantes. Existem coisas que precisam ser proibidas. Para poder impor essas proibições, o governo evidentemente precisa de recursos. Mas, um governo não tem capacidade ou poder para criar alguma coisa. Quem cria qualquer coisa são os indivíduos. O governo pode estabelecer proibições e tomar dinheiro dos cidadãos, por meio de impostos, para se desempenhar suas atividades. Sempre que faz isso, a sociedade fica menor, menos livre e menos produtiva.

Um capítulo muito divertido é A Economia da Sociedade Livre, em que Isabel denuncia a falta de sentido do marxismo. A teoria do materialismo dialético é uma corrupção da linguagem semelhante a dizer que um triângulo isósceles é verde. Tolos podem argumentar que um triângulo isósceles não é verde, mas azul, ou que o triângulo isósceles verde produzirá um círculo azul e os dois se sintetizarão em um rombóide púrpura; ainda assim, essas afirmações serão vazias. Mas Marx era um tolo com um grande vocabulário de palavras longas. Sua teoria de luta de classes é um completo nonsense por sua própria definição. Uma vez que trata de capital e de trabalho, não faz referência nem à luta nem a classes. É impossível que o capital e o trabalho lutem entre si.

A Constituição dos Estados Unidos resolveu o problema que Roma não havia conseguido: como criar bases regionais para uma estrutura política sem recorrer a uma aristocracia. O federalismo é essa solução. Os Founding Fathers fizeram um trabalho admirável de arquitetura. Construíram um mecanismo político que funciona e que permite que a nação cresça, aumente sua população e a quantidade de energia envolvida no sistema como um todo, sem que se altere o design intrínseco. Isabel chama atenção para a cláusula de traição da Constituição dos Estados Unidos, uma instituição inédita e singular na história. Em primeiro lugar, essa cláusula define que não existe traição em tempos de paz. Apenas uma rebelião armada ou unir-se a uma nação inimiga constitui traição, e nações só são inimigas quando em guerra. Nenhum tipo de oposição pacífica ou pessoal é traição, e nem mesmo o ataque armado de uma única pessoa contra o governo americano. Na Europa, qualquer ataque à pessoa do rei, mesmo que não fosse por razões políticas, seria tratado como traição. Nos Estados Unidos, a pessoa e o cargo são conceitos separados. Mas existe outro detalhe relevante. A cláusula estabelece que os bens de alguém condenado por traição só podem ser confiscados se o réu estiver vivo. Se morrer, os bens passam para seus herdeiros legítimos. Ou seja, a culpa é pessoal e a propriedade pertence aos indivíduos. 

A escravidão foi o grande defeito na estrutura criada nos Estados Unidos. Em nome do federalismo, os constituintes admitiram uma desastrosa e imoral solução de compromisso, que manteve essa instituição abominável no sistema que estavam criando. As conseqüências disso foram uma instabilidade crescente na nação, que resultou na Guerra Civil. A Guerra ensejou emendas à Constituição que desfiguraram parte do projeto. A Emenda 14 faz uma referência confusa a “poderes implícitos”, que causa discussões judiciais perigosas até hoje. A Emenda 15 cancelou a soberania dos Estados, ao impedi-los de determinar as qualificações dos seus eleitores. A Emenda 17 criou uma nova distorção do projeto original, ao tirar a eleição dos senadores das legislaturas estaduais e passá-la para o voto popular. Os senadores deveriam ser representantes dos Estados, enquanto os deputados seriam os representantes do povo. Da maneira como ficou, os Estados perderam essa representação.

Isabel analisa e desmonta diversos absurdos, como as leis antitruste, a chamada propriedade pública, o dinheiro sem lastro (fiat money), as teorias educacionais progressistas e a filantropia profissional. O capítulo XX, O Humanitário com a Guilhotina, o melhor do livro, trata exatamente desse tipo distorcido de filantropia. Ela ainda aborda as causas das depressões econômicas e discute como maximizar o poder militar de um país livre quando em guerra. 

A conclusão do livro, com a qual concordo totalmente é que a liberdade é a maior herança de que o homem já desfrutou. É o resultado do esforço heróico de incontáveis pessoas, por muitos milhares de anos. Darmos meia volta e nos submetermos à escravidão seria uma traição inominável a todas essas pessoas e às gerações presentes e futuras. Mas temos a oportunidade grandiosa de justificar a fé depositada por aqueles que acreditaram e acreditam na liberdade. Não percamos essa oportunidade!

Marcelo Centenaro
27 de setembro de 2014



Sobre a autora

Isabel Mary Bowler nasceu em 22 de janeiro de 1886, na Ilha Manitoulin, no Canadá. Seus pais, Francis e Margaret Bowler, tiveram nove filhos e eram muito pobres. Mudaram-se para Michigan, Utah e Alberta, em busca de uma vida melhor. Isabel entrou em uma escola rural aos 11 anos e freqüentou as aulas de maneira irregular até os 14. Porém, lia muito em casa. Lia a Bíblia, Shakespeare, Dickens e Alexandre Dumas, por exemplo. Era uma leitora voraz e autodidata. Por volta dos 18 anos, resolveu sair da fazenda e mudou-se para a cidade de Calgary, onde trabalhou como garçonete, taquigrafista e auxiliar de contabilidade.

Aos 24 anos, casou-se com Kenneth Paterson. O casamento não foi feliz e eles se separaram depois de 8 anos. Nesse período, Isabel Paterson conseguiu um emprego no jornal americano Inland Herald, em Spokane, no estado de Washington. Foi o início de uma carreira jornalística. Aos 28 anos, havia escrito dois romances, The Magpie's Nest e The Shadow Riders, ambos publicados pela John Lane Company. Depois da Primeira Guerra Mundial e de sua separação, mudou-se para Nova York, onde trabalhou para o escultor Gutzon Borglum, autor do memorial do Monte Rushmore. De 1924 a 1949, escreveu uma coluna de crítica literária no New York Herald Tribune. Foi uma das mais influentes críticas de sua época. Em 1928, aos 42 anos, naturalizou-se americana.

No final dos anos 30, Isabel Paterson liderava um grupo de jovens escritores que tinham opiniões semelhantes às dela. Entre eles, Sam Welles, Ayn Rand e Rose Wilder Lane. Foi mentora de Ayn Rand, que era 19 anos mais nova que ela. Isabel manteve estreita colaboração e troca de idéias com esse grupo. Porém, acabou rompendo com Rose em 1946 e com Ayn Rand em 1948.

Depois do final da Segunda Guerra Mundial, Isabel Paterson contribuiu para o ressurgimento do conservadorismo, correspondendo-se com o jovem Russel Kirk nos anos 40 e com o jovem William F. Buckley, nos anos 50.

Morreu em 10 de janeiro de 1960. Foi enterrada no túmulo da família de Sam Welles, em Burlington, Nova Jersey.



Livros de Isabel Paterson

- The Shadow Riders (1916)
- The Magpie's Nest (1917)
- The Singing Season (1924)
- The Fourth Queen (1926)
- The Road of the Gods (1930)
- Never Ask the End (1933)
- The Golden Vanity (1934)
- If It Prove Fair Weather (1940)
- O Deus da Máquina (1943)
- Joyous Gard (não publicado; terminado em 1958)